domingo, 7 de abril de 2013

Destacando Alphonsus Guimaraens Filho e Latipac


Poemas dedicados a um outro poeta era prática comum entre poetas. Aproveitava-se o verso para exaltar a figura de outro artista. Era uma forma de prestar homenagem e ao mesmo tempo revelar a própria arte. Alphonsus de Guimaraens Filho foi um desses que dedicou sonetos a outros poetas, muito interessantes e cheios de sensibilidade. Denominou-os "Sonetos com dedicatória", dentre eles destacamos:

A "Luís de Camões"

"Teus idílios renascem palpitantes
do mesmo sonho que foi teu um dia,
- estrela da manhã, saudoso guia
da tua nave em solidões distantes...

Som de áspera tuba, de macia
avena, a tua voz tem ofegantes
acentos, e esses tons acariciantes
de rosa aberta a receber o dia...

poeta do amor e dos descobrimentos,
como em teu coração não latejava
o sentido da ausência, e seus tormentos.

E como agora cresces do passado
que a tua ardente musa iluminava,
no noturno silêncio repousado."


Em meu livro Latipac - a cidade e seus espelhos, pela Giz Editorial, há uma única poesia sobre as cidades/capitais, suas características e os seus maiores poetas. Busquei falar, na verdade de cada poeta e da cidade em que nasceu, viveu, se consagrou, pela qual ficou conhecido, ou da capital do país de que era natural (uma vez que a  poesia centra-se nas cidades e não nos poetas, que entram como coadjuvantes e intérpretes da comunidade que os viu nascer para a vida intelectual. Assim surgiram (estavam dentro de mim, em gestação) alguns binômios, como: Byron (Londres), Shakespeare (Stratford-on-Avon), Basho (Tóquio), Neruda (Santiago/Isla Negra), Leminski (Curitiba) Vinicius de Moraes (Rio de Janeiro), Guilherme de Almeida/Álvares de Azevedo (São Paulo) e outros (uma grande parte das capitais do mundo e várias cidades brasileiras, com seus respectivos poetas). São 237 páginas, em que divido em três grandes partes: Do Cenário (versos sobre a construção das cidades); Das Urbes (versos sobre diversas capitais do mundo e/ou cidades, suas característiscas e personagens - poetas); e, De Solrac (meu heterônimo, meu anverso, meu Id e meu superego, que verseja sobre a beleza e angústia de viver na cidade/capital - Latipac - e, no fundo é aquele que fala desde o início da poesia).
Assim, também fiz, a meu modo, e uma vez que não fui desestimulado de cometer este "assassinato contra o fazer poético (talvez, a minha editora pudesse tê-lo impedido) uma poesia, ou seja lá o que isso for, abrangendo todos esses aspectos. Não me contive, e busquei homenagear cada cidade e seu poeta. Não o foi graciosamente, nem produto de algum conhecimento acumulado, que pudesse ser demonstrado para os incautos, mas a necessidade de dizer que o espírito de cada urbe, de cada cidade, está bem representado nos seus poetas maiores, que a viveram e dela receberam influência - luz e sombra, felicidade e tristeza - e produziram seus versos, sem que os seus concidadãos o tivessem percebido. E, principalmente, a revelação (para mim) de que as cidades são muito iguais, não importa o tempo e nem o espaço. Todos nós, que vivemos em algum aglomerado urbano, sofremos os mesmos males e temos iguais esperanças. As cidades são uma grande festa, mas continuamos, como indivíduos, muito solitários. As cidades produzem solidão. Aí está uma neurose fundamental.
Aqui vai apenas um verso, escolhido à toa, de cada parte do referido livro:

Do Cenário

(o homem atua)

Viu-se unido às tempestades
                   e aparelhado
de instrumentos e de ciência
                 pôs mãos à obra
e construiu a civilização
com a ajuda de seus iguais,
       em conjunto,
       de mãos dadas,
buscou refazer os elementos
e da gestação dos cimentos
abortaram-se os paralepípedos,
um após outro, encaixados,
por quilômetros e quilômetros.
Traçou as primeiras retas
e o horizonte chegou perto
formando ruas."

Das Urbes

(destacando São Paulo e Álvares de Azevedo)

ama-se tudo e a todos,
nos becos desta cidade,
que em cada casa,
em cada lar,
em cada emudecido casebre,
em cada palácio solar,
em cada UTI de hospital,
em cada cama hospitalar,
em cada suor animal,
em cada olhar infinito,
daquele que vai morrer,
ouve-se da alma um grito,
de quem deixou de sofrer,
e a alma que amara,
e pusera no amor o coração,
assina sem muita luta,
    sua capitulação.
"se eu morresse amanhã,
Minha mãe de saudades morreria,
Mas essa dor da vida que devora,
A ânsia de glória, o dolorido afã...
A dor no peito emudecera 
                              Ao menos
Se eu morresse amanhã!" 

De Solrac

(últimos versos)

Resta a esperança,
de acreditar no infinito.

Resta o café na tarde morna,
e a sopa nas noites frias.

Resta o José, o João, a Gisela,
o Antero, a Cláudia, a Maria.

Resta quem possa nos sentar
no colo sem se atrever
     a nos cobrar
        ou a nos escarnecer.

Resta você que me escuta,
     que me lê,
     e que acredita.

Resta esta relação afetiva,
em cada linha escrita ou lida.

Resta esta vida.

Carlos Roberto Husek

Um comentário:

  1. A vida por vezes pode ser dura e as pessoas verdadeiras navalhas - e há então pequenas pílulas, pequenos bálsamos, como estas linhas, que nos desanuviam a alma : )

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