domingo, 14 de abril de 2013

Um pouco de Jorge Luis Borges



Difícil falar de Borges. Por onde começar?  Borges viveu seu mundo particular (contos fantásticos - cuja realidade é posta de lado e sobram as coisas do sonho, do mundo anímico, daquele mundo sem a lógica da vida racional), como aquele conto que escreve sobre um encontro com ele mesmo, num banco de jardim..! Agora estou esquecido do nome, mas em outra postagem vou informar. Afinal, quando se escreve sobre alguém, se a escrita for com a alma, entra-se no personagem. Torno-me Borges neste momento e não sei bem se o encontro existiu... O dele com ele mesmo, existiu, pelo menos no papel. Eu, estou à minha procura. Não é de agora... Tenho uma vaga certeza do que sou (assim, se é vaga, na verdade, não tenho certeza nenhuma). Fico um pouco borgeniano, ou pessoano (com os meus heterônimos, minhas personalidades). Todo aquele que se propõe a escrever (bem ou mal, com técnica ou não, com arte ou com nenhuma arte - meu caso...), se faz disso costume acaba por viver uma fantasia. Voltemos a Borges. Viveu quase cego boa parte de sua vida e em cegueira total uma grande parte. A vivência de seu mundo interior em confronto com o mundo das ruas, talvez tenha produzido o fantástico de seus contos e de algumas de suas poesias. Claro está, que não estava afastado da realidade. Não. Ao contrário. Dava aulas de Literatura Inglesa e era ligado nos acontecimentos, mas voltava-se para o seu próprio interior. Através da íris, janelas fechadas, vislumbrava uma verdade própria. Acho que os poetas e escritores, em geral, são eternos pacientes de eventuais analistas, ou no mínimo de teorias psicológicas e psicanalíticas, porque são exemplos vivos de que o ser se subdivide, se transforma, se teatraliza, e em determinados momentos pode vir a tarnsformar-se completamente e parecer aquilo não é, ou ser aquilo que parece ser. O artista da palavra (ou que assim se pensa) encarna personagens, por mais que descreva de forma crua a realidade.  Todo escritor, principalmente, todo poeta é um fantasista ("O poeta é um fingidor/finge tão completamente/que chega a fingir que é dor/a dor que deveras sente" - Pessoa). Disse Borges, "realisticamente" sobre as ruas de Buenos Aires, através de sua visão interior:

            As ruas

 "As ruas de Buenos Aires
 já são minhas entranhas.
 Não as ávidas ruas,
 incômodas de turba e de agitação,
 mas as ruas entendiadas do bairro,
 quase invisíveis de tão habituais,
 enternecidas de penumbra e de ocaso
 e aquelas mais longíquas
 privadas de árvores piedosas
 onde austeras casinhas apenas se aventuram,
abrumadas por imortais distâncias,
a perder-se na profunda visão
de céu e de planura.
São para o solitário uma promessa
porque milhares de almas singulares as povoam,
únicas ante Deus e no tempo
e sem dúvida preciosas.
Para o Oeste, o Norte e o Sul
se desfraldaram - e são também a pátria - as ruas;
oxalá nos versos que traço
estejam essas bandeiras."
             
Apesar das descrições sobre as ruas de Buenos Aires, Borges utiliza de vocábulos que lhe são reais, mas que para as pessoas que só enxergam o cimento, as árvores, os carros, os postes, as placas e etc., são licenças poéticas sem qualquer significado, como: as ruas são minhas entranhas; ruas entendiadas do bairro; ruas quase invisíveis de tão habituais; ruas enternecidas de penumbra e de ocaso; ruas privadas de árvores piedosas; ruas de austeras casinhas; ruas abrumadas por imortais distâncias... Pensando bem...Fechando os olhos...Também temos ruas assim. Ruas que nos falam e nas quais podemos andar por uma eternidade: portões,  casas,  árvores, poças de água,  pedras,  telhados. Alguém ainda olha para as ruas ou somente consegue vislumbrar as poucas letras e números do celular? No meu livro O Cavalo da Escrita, lançado em 2005, tive uma sensação diferente do cotidiano, mas não atípica, porque a tenho quase sempre ao andar por algumas ruas (não me lembro o bairro) e escrevi:
                                                   Retiro

                                    Gosto de ver casas antigas
                                       em ruas despreparadas,
                                       periféricas, esquecidas,
                                    abaixo do nível das calçadas.
                                       Tornam-se mais tristes
                                    quando pelas chuvas lavadas.
                                    Gosto de ver casas antigas
                                       em ruas desmotivadas.

                                    ..............................................

                                     No meu espírito há também
                                              casas assim
                                     e um número infinito
                                     de ruas insipientes
                                     e de caminhos sem fim.

Por certo, não estava andando com um celular ligado... Mas, portava um bloco de papel e uma caneta e parei para escrever (acho que também não deve ser bom fazer isso... - nos dias de hoje poderia ser assaltado - no caso só me levariam o bloco e alguns trocados). Para quem não conhece ( porque já me perguntaram) "insipientes" aqui quer dizer ignorantes (ruas ignorantes, insensatas, imprudentes...), e não "incipientes" (que começa, que princípia). Minhas ruas, aquelas em que andei ( e que ando, às vezes sem sair do lugar) não começam, não terminam, ignoram-se e, talvez, me ignorem, embora estejam dentro de mim... É isso..! Carlos Roberto Husek.   
                                           

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