quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Homenagem a Drumond


Aniversário de Drumond, hoje (31.10.2012) faria, salvo engano 110 anos, nascido em Itabira, Minas Gerais, viveu no Rio de Janeiro  e escreveu para o mundo. Latipac, embora de forma indireta, sofreu, provavelmente, influência de um certo estado de espírito, presente em Drumond, que, como um bom poeta, era solitário, não de uma solidão romântica, mas de uma solidão social, uma solidão da cidade, produzida pela cidade, que envolve os citadinos, em decorrência de suas ruas, de suas avenidas, de seus prédios, de seus olhos em olhos amigos no interior das escolas, das firmas, das fábricas. Uma solidão em decorrência dos gestos e das falas entrecortadas. Uma solidão tão solitária e inexplicável, que nem sabe de sua própria existência, iludida pelo azáfama da cidade. Fala-se tanto, falamos tanto; age-se tanto, agimos tanto, sempre comprometidos com afazeres e metas que nos esquecemos!. Esta é a verdadeira solidão da cidade! Esquecemo-nos do que fomos, do que somos, do quer nossa alma e das pessoas que são ou nos foram caras, porque mesmo estas estão desaparecidas,  dentro de seus próprios corpos, e não as reconhecemos quando passam por nós e para nós se dirigem, formal e socialmente. Somos ilhas, quase incomunicáveis, de mata densa e práias virgens. Quem nos conhecerá ao final de cada dia, de cada semana, de cada mês, de cada ano? Temos que conviver com esta falta de comunicação.
Disse Drumond, nos seus versos de "Uma hora e mais outra": "ja teu passo avança
                                                                                                    em terra diversa.
                                                                                                    Teu passo; outros passos
                                                                                                     ao lado do teu."

ou, no verso do poema "América": "é possível distribuir minha solidão, torná-la meio de conhecimento,"

ou, a um conselho dado a um amigo: " Mas há que tentar o diálogo, quando a solidão é vício."

Hoje, ficamos por aqui. Carlos Roberto Husek

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Salvador

(destacando Castro alves, versos grifados em Navio Negreiro)

'"Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali'
A pele negra queimada,
                  pela água salgada,
pelo sangue dos ancestrais,
rema na madrugada,
algemada, mais e mais"

'"Quem és tu? Quem és tu?
És a glória talvez!
              Talvez a morte!...'
A luta incessante,
               a incessante lida,
e tudo se resume na força
                        do povo,
que torna a morte amortecida,
e tudo se resume na força
                        do povo,
que torna a morte sentida,
e tudo se resume na força
                        do povo,
que torna a morte aquecida,
pelas artes, pelos livros,
pela cultura criativa,
'Livros...livros à mão cheia...
E manda o povo pensar!
O livro caindo n´alma
É germe - que faz a palma,
É chuva - que faz o mar.'"

Antônio de Castro Alves nasceu em 14 de março de 1847 e morreu em 6 de julho de 1871. poeta baiano que viveu boa parte de sua vida em São Paulo, como estudante da faculdade de Direito do largo São Francisco. Não terminou o curso - morreu aos 24 anos - não terminou a vida, somente terminou - parece - sua poesia, social "Senhor Deus dos desgraçados!
                                                              Dizei-me vós, Senhor Deus!
                                                              Se é loucura... se é verdade
                                                              Tanto horror perante os céus...
                                                               Ó mar! por que não apagas
                                                               Co`a esponja de tuas vagas
                                                               De teu manto este borrão?...
                                                               Astros! noite! tempestades!
                                                               Rolai das imensidades!
                                                               Varrei os mares tufão!...

e romântica "A vez primeira que eu fitei Teresa,
                    Como as plantas que arrasta a correnteza,
                    A valsa nos levou nos giros seus...
                    E amamos juntos... E depois na sala
                    "Adeus" eu disse-lhe a tremer co`a fala...
                    E ela, corando, murmurou-me: "adeus".
alcançando um grau de genialidade jamais observada por um poeta nacional. Não há necessidade de dizer mais nada!

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Buenos Aires

(destacando Jorge Luis Borges, versos grifados de Obras Completas, Milonga para os Uruguaios)

Nas ruelas da Recoleta
há fantasmas de ricos e abastados,
e nomes de formosura,
e grandes túmulos ancestrais,
de escritores, políticos,
     de artistas,
que deixaram suas marcas,
que ficaram no passado,
'"Ombro a ombro ou peito a peito,
Quantas vezes combatemos,
Quantas vezes nos venceram,
Quantas vezes venceremos!'"
no passado, a estação
mais propícia á morte.

'"Um só homem sentiu no paladar
o frescor da água,
o gosto das frutas e da carne'"
este homem
na sua cega anatomia,
percorria e percorria,
as ruas que se banhavam
na luz de sua ousadia,
um Jorge Luis Borges,
nos alforjes forjado,
nos contos fantásticos,
nas reais fantasias,
nas poesias que planaram
em sua futura agonia,
de não ver o rio e a cidade,
de suas filosofias

Os meus versos antecedem ou continuam alguns versos dos autores consagrados, como é possível ver nesta e noutras poesias. Uma espécie de parceria, sem licença para tanto ( se soubessem me acionarem na Justiça em todos os países e cidades que citei). Mas busco, na verdade, revelar um pouco do autor e da cidade respectiva ou das cidades respectivas. No caso de Borges, como todos sabem, cego, professor de literatura inglesa e que tinha uma predileção em andar pelas ruas de Buenos Aires, sem enxergá-las por completo ou de todo e que, talvez por isso, encontrou na sua imaginação o fantástico (contos fantásticos; poesias um pouco mais de acordo com a realidade, mas fantásticas - toda poesia o é). O fantástico impera em nossas vidas (já repararam?). O que é a realidade, senão a nossa interpretação daquilo que enxergamos (ou não enxergamos), em construção diária!? O mundo é mágico e Jorge luis Borge soube por essa magia no papel ( como escreveu no seu conto sobre o outro, que encontrou em um banco de jardim e que não era senão ele mesmo...!) Borges, nasceu em Buenos Aires, em 24.8.1899; morou em Genebra, na Suiça e na Espanha - Madri, se não me engano, provavelmente também na Inglaterra (admirava a literatura inglesa), e morreu em Genebra em 1986. Entre o mundo visível e o mundo invisível (sua cegueira) descreveu o seu verdadeiro e nos deu páginas de beleza e de inquietude não só poética, mas, principalmente, filosófica. Carlos Roberto husek

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Havana

(destacando Dulce Maria Loynaz - Queira-me inteira)

Há os vivos que
            caminham,
e os que fumam
e refundem seus ossos
e seus músculos,
e suas peles tostadas,
para as suas moradas,
suas revoluções
            particulares,
por suas paixões coletivas
       e individuais,
'"Se me queres, queira-me
                      inteira
Não por zonas de luz
        ou sombras.
Queira-me toda...
     ou não me queiras!'"


domingo, 21 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Nova Iorque

(destacando Edgard A. Poe, versos grifados de O Corvo)

'"Nunca , nunca,
           nunca mais'
disse o corvo, cabeça lisa,
corpo preto, olhos negros,
no quarto de Poe,
como somente soem
ser os corvos anunciantes,
de verdades delirantes,
à meia-noite na madrugada,
após a brisa desperta,
com dois toques vagabundos,
assustando quem dormia,
com esta sinfonia de duas notas,
e uns olhos fixos e profundos,"

(destacando Walt Whitman, versos grifados de Folhas de Relva)

'"A fisiologia, o que vai da cabeça
          aos pés, eu canto.
O homem moderno eu canto'
E de tanto cantar-se a si mesmo,
     cantou-se no seu encanto,
a barba branca emplumada
     de sabedoria e espanto,
de tanto cantar-se a si mesmo,
     encantou-se no entanto,
de barba branca emplumada,
     no rosto a marca do pranto,
     no rosto a marca da vida,
     no rosto as folhas secas,
                           caídas,
     no rosto as folhas de relva,
                           perdida,
     no rosto luz e sombra,
                           aquecidas,
     no rosto a marca do tempo,
               arrependida,
               visualizada,
               querida,
     coberta com o musgo
das folhas enverdecidas."

(destacando Emily Dickinson, versos grifados de Poemas)

'"Morre a palavra
Quando é falada,
       Dirão.
Digo:- Só então
Ela começa a 
             Viver'.
É a palavra o veículo
    que leva em seu bojo,
o significado social,
de que vem embuída,
e o seu significado pessoal
que o interlocutor
           mal desconfia."

(destacando Edward E. Cumming, versos grifados de XIX Poemas)

'"assim a razão
         venceu o instinto e
a matéria se tornou
         escrava do espírito;
assim a virtude
         triunfou sobre o vício.'

(destacando Thomas S. Eliot, verso grifados de A Canção de Amor de J. Alfred Prufrock)

'"Sigamos então, tu e eu,
Enquanto o poente
no céu se estende,
como um paciente
anestesiado sobre a mesa.'
Este binômio eficiente,
que encerra o mundo todo,
no universo de dois,
e deixa o fim dos tempos
para um tempo depois."

Nova Iorque teve estes e outros poetas. A cidade do mundo, a cidade de pedra, a cidade de espelhos, a cidade dos automóveis, a cidade das lojas, a cidade dos restaurantes, a cidade das luzes, a cidade dos pedestres, a cidade dos extremos, a cidade das quadras, a cidade dos ícones, contém vielas solitárias, ruelas inexpressivas, homens e mulheres comuns, pobres e sofridos, e cachorros abandonados e crianças que buscam na imaginação outras realidades e vários e vários estrangeiros em passos perdidos. Carlos Roberto Husek.

sábado, 20 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Santiago/Isla Negra

(destacando Pablo Neruda, versos grifados, em Canto Geral)


'"Eu quero terra, fogo, pão,
                     açucar, farinha,
mar, livros, pátria para todos,
          por isso ando errante.'
Fustigou contra as ditaduras
e acariciou o povo pobre,
que nisso aproximou-se de Hugo
embora com outra têmpera
embora com outra vontade.
Restou Santiago,
   pela conquista de valdívia,
   a serviço de Pizarro asfixiando
                a revolta indígena,
   cruzando os vales de Copiapó
                           e Coquinho,
e de posse de Mapocho,
criou a cidade e seus arredores.
Hoje resta de sua gênese,
de seu rio, de suas nevadas,
de seus Nerudas e de suas estradas,
uma cidade motorizada,
de gigantescas torres de pedra,
de profusões de solos amestrados,
de jardinagem em cada morada,
de uma coleante e viva fila
de mulheres e homens,
         em busca da moeda,
em busca da conquista,
em busca da excelência,
          gerencial, administrativa,
uma cidade igual às outras,
a Latipac esfriada pelos andinos."


Pablo Neruda, chileno, poeta, diplomata, universal, mas sua poesia tinha o gosto da terra de seus amores, da terra que o viu nascer, de sua natureza, e riqueza de suaa comunicação descritiva e poética, que pode ser sentida e entendida pelos diversos povos, porque, afinal, somos todos herdeiros dos mesmos átomos, espalhados pelo planeta:
"Escrevo para uma terra recém-secada, recém-
fresca de flores, de pólen, de argamassa,
escrevo para umas crateras cujas cúpulas de giz
repetem seu redondo vazio junto à neve pura,
opino de imediato para o que apenas
leva o vapor ferruginoso recém-saído do abismo,
falo para as pradarias que não conhecem nome
além da pequena campânula do líquem ou o estame queimado
ou a áspera mata onde se inflama a água."

Isto é Neruda. A poesia escorre pelas veias, pelos olhos, pelo coração, pela pele. Somente um poeta pode escrever para as pradarias que não conhecem nome e para uma áspera mata onde se inflama a água. Carlos Roberto Husek

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Praga

"Kafka sob uma capa negra,
paletó abotoado,
colarinhos brancos
                  e arredondados,
a gravata também sóbria,
leva em seus bolsos
breves frases a seu gosto,
de seus dias de tristeza,
 carregando no seu bojo,
fantasmas de personagens
      que se transformam
em insetos, em miragens."


Pouco espaço dei a Praga, em sua poesia. Faço-o agora. Deveria ser diferente, uma vez que minha família, por parte de pai, veio daquela região, da velha Tchecoslováquia, e também da Iugoslávia. Não sei porque não saíram mais versos, quando sinto no sangue alguma química de gerações antigas? Talvez, porque, por parte de mãe fale mais alto o sangue italiano. Este casamento, de três países, ou de muitos ( a região dividiu-se e subdividiu-se, entre a Tchecoslováquia e a Iugoslávia, no mínimo - se bem lembro - em sete novos países, que contemplam identidades antigas e plenamente separáveis) ou de um único país (não sei se este seria o termo certo), do antigo chamado Império Áustro-hungaro, que englobava toda aquela região. Conclusão: não sei, efetivamente, de onde vêm meus antepassados. Existiram, sem dúvida, mas sem cor definida, daí me sentir um cidadão do mundo. Os eslavos orientais (Grandes Russos, Ucranianos, Bielorussos), os ocidentais (Polacos, Tchecos e Lusácios), os meridionais (Eslovenos, Croatas, Sérbios, Bósnios e Montenegrinos, Macedônios e Búlgaros); uma única família eslava, todavia, muito diversa..
Hans Kafka, judeu eslavo, nascido em julho de 1883, em Praga, morto em junho de 1924, viveu, como é bem do nosso gosto, intelectualmente ativo e nas sombras. A casa de Kafka (estive lá), caminho da igreja, pequena (agora azul), com uma porta e janela que parecem de brinquedos, revelam um homem de baixa estatura. Lá dentro, cantos escuros (assim me pareceu), onde, provavelmente Kafka ficava pensando na vida, entre as sombras, escrevendo e saindo para o seu trabalho, confidenciando com um grande amigo, Max Brod, que o trai ao fazer vir ao mundo os escritos que lhe foram confiados, desautorizado de qualquer publicidade. Santa traição! Grande amigo! Tirou Kafka do anonimato e sobre ele direcionou um foco de luz. Veio ao mundo o inseto: " Certa manhã, depois de despertar de sonhos conturbados, Gregor Samsa encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso." Quanto de nós não se levanta metamorfoseado em um ser estranho? Só com o passar do dia é que nos encontramos. Eu, mesmo, confesso, até o final do dia, conservo algumas patas estranhas, algumas antenas insuspeitas, um corpo cascudo, alguns órgãos moles, e olhos que enxergam a paisagem humana em várias dimensões. Fico assim, inseto, até ser chamado à realidade. Realidade? Carlos Roberto Husek

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos



Calcutá/Mumbai/Nova Délhi


"tudo se enfraquece,
                  desaparece,
se esfuna,
e Rabindranath Tagore,
com seu poema,
não vai a parte alguma,
poque os túmulos
                  permanecem,
na vida e após a vida,
       de terra e pó
       e fenecem
os corpos em cada caverna,
       com a laterna
       da eternidade,
pelos passeios empoeirados,
       da cidade,
pelos passeios empoeirados,
       da superios bondade,
pelos passeios empoeirados,
       sem consumismo,
       ou vaidade,
nos lençóis brancos
                     enrolados."

É interessante notar que nas cidades mencionadas ao longo de Latipac, com destaque de alguns poetas e alguns versos, e, principalmente com a busca do espírtito de cada cidade, que no fundo é o mesmo em todas elas, os versos são sempre versos em branco e normalmente sem rima (emparelhadas, alternadas, cruzadas, intercaladas, encadeadas, continuadas, misturadas; pobres, ricas, preciosas, e etc). A rima é apenas uma possibilidade no conjunto da obra. O que interessa - creio - não é a rima ou a contagem clássica das sílabas (métrica - versos pentassílabo, octossílabo, eneassílabo, decassílabo e outros), e sim o RITMO. O ritmo é tudo na poesia, pelo menos na poesia de Latipac.
Mesmo a estrutura estrófica  (dístico, terceto, quadra, quintilha, sextilha, sétima, oitava, nona, décima) merece um lugar nas considerações poéticas e em alguns momentos do poema foi levada em conta, mas sem qualquer precisão, porque somente se importante ao ritmo é que tiveram alguma preocupação. O ritmo tem por base a harmonia sonora, e mais a harmonia da idéia, a musicalidade que está presente no som, na falta de som específico ao ouvido, mas de som específico ao espírito. Sentir é necessário, explicar é supérfluo. Em Latipac, o ritmo  está na poesia como um todo. Infelizmente há necessidade de ler do primeiro ao último verso e de sentir, mesmo os espaços em branco ( o espaço em branco e a forma do verso, começando em espaços diversos, em cada linha), para se concluir que há um ritmo. Difícil? Não para quem possa estar aberto ao sentimento. Espero sempre falar aos corações. Aí está o ritmo. Carlos Roberto Husek

domingo, 14 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos

Em continuidade ao nosso livro destacamos:

Varsóvia/Moscou

(versos grifados de Mandelstam - Fogo Errante)

'"Nas alturas abruptas,
      Fogo errante!'"
      incessante,
e nas alturas a estrela,
     de cristal,
do cristal quebrado,
que do espelho se observa,
     pertido pelo lado,
e que reflete a imagem,
da vela sobre o prato."

( versos grifados são de Mayakóvski - Poemas)

'"eu faço versos alegres
          como marionetes
e afiados e precisos
como palitar dentes.'"
por sua força,
por sua audácia,
por sua mão de ferro,
fechado o punho,
           em desafio,
            morreu,
como morrem
os passarinhos"

Damasco


( versos grafados são de Rûmi - Maulâna Djalal ad-Din Rûmi - A Sombra da Amada)

"Do Nada que é matéria,
                         artéria,
                         estrada,
do tudo, deste mundo,
que é gestado,
no ventre da inércia,
no ventre dos buracos,,
no ventre do vazio,
onde tudo repousa,
o próprio repouso
..............................
'"Ah! Cessa esse murmúrio
                   de palavras:
escuta o silêncio
               a voz de Deus'"

Os poemas russos  (Óssip Mandelstam e Vladmir Mayakóvski) e o de Damasco (Rûmi) representam o ser humano em sua força intrínseca; os primeiros voltados para a sociedade e para a sua luta, os últimos para o mistério da vida. As cidades, não importa a situação geográfica, produzem no citadino a ilusão de poder e de fracasso e ele se volta para a mensagem, por seus atos, por sua fala, por sua escrita e também para o invisível, na busca de explicações, ou simplesmente de silêncio. As cidades buscam nos homens suas artérias e suas cosntruções; os homens buscam nas cidades a vida que acreditam ter, independentemente de suas lutas. Há, efetivamente, um silêncio, um diálogo surdo entre as cidades e o homem, entre este e o universo. Parece que as cidades gritam nos ruídos das matérias e o homem silencia nos seus ruídos internos. Carlos Roberto Husek  

sábado, 13 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos

Continuamos a destacar algumas partes de nossa poesia no capítulo "Das Urbes"

Pequim/Xangai

(destacando Ai Qing - em A neve cai sobre a Terra da China)

"Do mar profundo
à montanha mais alta,
'"A neve que cai sobre
a terra da China,
enregelada pelo frio.'"
Da aldeia querida,
no seio de uma colina,
tão iluminada,
quase purpurina,
de pinheiros coberta,
encobrindo as aldeãs,
que nos seus afãs,
lavam legumes e roupas,
      logo de manhã."

Ai Quing nasceu na China, em 1910. Obteve tradução de seus poemas em diversas linguas, inglesa, francesa, alemã, malaia, espanhol, portuguesa e etc. É considerado um representante da poesia moderna da China.  Ai Quing foi amigo de Pablo Neruda e de Jorge Amado. Não sei se encontrar-se-ia alguma influência em seus versos brancos e sem rimas, dessas amizades.
Há uma ingenuidade nos versos de poetas chineses em geral, em relação à vida. Tal ingenuidade vem traduzida, por vezes, em imagens de profunda beleza: "Ó Rio Dayen, neste dia de neve penso em ti!/ Penso no teu túmulo coberto de ervas murchas debaixo da nevada."

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Londres


(destacando John Milton/ Paraíso Perdido)

"Perdidos, Adão e Eva
      ouviram a serpente,
cobiçaram a maçã,
      a fruta comeram,
que caía saborosa ao lado,
e disso nasceu o fruto,
desarmonioso e bruto
      do pecado."


(destacando George Gordon Byron/Trevas)

'"Tombavam, desfaziam-se
- e estralando os troncos,
Findavam num estrondo
- e tudo era negror.'"

"Morreu cedo, e sempre tarde,
que todo poeta na pira arde,
de uma essencialidade,
de uma humanidade infeliz."

Com sempre, o que transcrevo em negrito são versos do próprio poeta, no caso Byron, que incorporei na minha poesia ao falar sobre Londres.


Tóquio

(destacando Basho)

"Basho triste canta,
nos seus haicais,
'" folhas tremulam
No campo queimado
À espera da lua'".
O som sobe o vulcão
de neve derretida,
e petrifica-se."
"

O transcrito em negrito são versos de Basho, em poema composto no templo de Kashima. A poesia japonesa tem a delicadeza do olhar, e, principalmente os haicais, revelam em poucas palavras e versos simples a profundidade da paisagem ou do sentimento. As folhas tremulam no campo queimado à espera da lua é de beleza impar. Só um poeta ( e um poeta japonês, versejando em haicais) poderia em poucos vocábulos situar o campo de visão - campo queimado - folhas que têm vida - folhas tremulam - esperando a Lua. Quem pode esperar a lua em um campo queimado? Nós, humanos, poderíamos fazê-lo, e talvez o façamos, no mais simplório dos mortais, que solitário e esquecido e lutando com e contra a vida, tira o seu sustento da terra, longe dos grandes centros e espera ao final do dia o céu estrelado e a Lua. Os citadinos não desconfiam que exista essa vida, esse olhar, essa possibilidade. A humanidade aí se encontra na figura solitária do ser humano e/ou das folhas trêmulas, ou, como o nosso Mário Quintano, que disse em alguma prosa poética: " Fumar é um jeito discreto de ir queimando as ilusões perdidas.", ou, ainda, "O verdadeiro poeta faz poesia com as coisas mais simples e corriqueeiras deste e dos outros mundos."  
Até mais. Carlos Roberto Husek

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos

Continuamos um périplo pela poesia Latipa, destacando os capítulos de que ela composta, agora "Das Urbes", em que observo versos sobre a grande maioria das capitais do mundo e do Brasil, com apontamento de suas características (poéticas, não geográficas, políticas ou econômicas) e de seus representantes intelectuais (principalmente poetas). A idéia em relação a estes é a de que os poetas tem antenas com as quais conseguem sentir o que está no ar, no presente, o que vem do passado, (no mundo nada se perde, tudo se transforma), e que  se apresenta para o futuro ( na verdade, passado, presente e futuro fazem parte de uma mesma realidade: tudo é o agora, o tempo é uma ilusão).

Frankfurt/Berlim

(destacando Goethe)

"Fausto olha-se no espelho
e o medo arrepia-lhe a espinha,
uma caveira ancestral
sorri absorta,
enquanto pela ação do vento
uma janela se abre,
estremecem os trincos
de uma porta de fundo,
bate-se outro na porta,
que anuncia o lamento
                           do mundo"

(destacando Heine)

'"Seiscentas peças barganhei
    ...Que pechincha!
               ....no Senegal;
A carne é rija,
Os músculos de aço,
boa liga do melhor metal"'
Os escravos que em navios
              partiram
pela venda por seus algozes,
só cantavam suas tristezas,
só se ouviam suas vozes,
lá, como no Mundo Novo,
   a sensibilidade aflorou,
   e o poeta reagindo,
contra este capital
               se arvorou,
o comerciante só via as moedas,
escorregadas sobre os peitos magros,
e que tilintavam na dança,
    do oceano aziago.
'"Crito Jesus, lá de seu horto,
Salva meus pretos, eu te peço!
Se não chegar metade ao porto,
Deste negócio eu me despeço.'"

O que vem grifado (como já expliquei) pertence à minha poesia, mas é transcrição que nela faço de versos do próprio poeta destacado.

Importante dizer que a escravidão continua na pele preta, na pele branca, na pele amarela, e em outras peles e roupagens, nem sempre físicamente imposta.
As cidades, fontes de relacionamentos e oportunidades, são ao mesmo tempo fontes de tristezas e incompreensões. Naquele tempo de Johann Wolfgang Goethe ( idos de 1750/1800) e de Heinrich Heine (idos de 1827/1840), a miséria humana, as crenças, a tentativa de respaldo e segurança com o mundo espiritual, uma vez que o mundo terreno parece pobre e inseguro. O dinheiro, como deus, a regrar as relações humanas, a fazer vistas grossas para a dignidade, a ignorá-la, a ver o ser humano como mercadoria, antes consagrando na diferença de raças, hoje consagrando na diferença de conceitos. Penso que o abismo continua entre os seres humanos, independente de raça ( e até somando-se a ela), abismo não de cultura: abismo da falta de solidariedade, abismo da falta de amor, abismo da falta de condescendência, abismo da falta de amizade; abismo da existência mesma, que nos faz pensar sermos únicos em nossa personalidade, em nosso caráter, em nossa filosofia, em nossa particular justiça. Aí só nos resta apelar para o mundo invisível ( os espíritos que nos ajudem: anjos ou demônios) e para o poder do mundo visível (poder de mando, poder do dinheiro, poder da posição social). O mundo progrediu tecnologicamente, mas continuamos, individual e socialmente, os mesmos. Os poetas não são passados, são presentes e futuros. Goethe e Heine poderiam estar vivos, fisicamente, que fariam, sem dúvida, poesias extraordinárias. O mundo não mudou muito. Carlos Roberto Husek. 

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos

Madri

"Cervantes,
pega o pão do lixo
e se esconde em um nicho,
entre uma cruzada e outra
não tem um Rocinante,
mas um cachorro encardido,
Cervantes só tem uma pança,
            de vermes comido."

Cervantes e o sonho de sair a busca de atos heróicos. Sonhos de todos nós, heróis anônimos, que recebemos nossos próprios aplausos e nossas prórpias críticas. As cidades são assim, lugares que acomodam os solitários humanos que possuem a ilusão de pertencerem a um grupo, uma raça, uma nação. No fundo estamos sós com nossas idéias, com nossas virtudes, com nossos defeitos, buscando a comunicação. As cidades têm esta virtude: a busca incessante da comunicação, mas que não disfarça a ilha que somos  das demais ilhas que tentamos atingir. Profunda contradição: andamos e conversamos e comunicamos, mas estamos sempre sós.
Abaixo destacamos Garcia Lorca.

"naquela tarde fatídica,
somente às cinco horas da tarde,
hora que Garcia lorca,
registrou no seu relógio,
porque se manchava o céu,
sob as patas do animal,
porque se manchava o céu,
do sangue que na arena escorria,
porque se manchava o céu,
no sangue de Frederico,
no pranto desacostumado
de Ignácio Sánchez Mejías,
"' A morte botou ovos na ferida
às cinco horas da tarde.
Às cinco horas da tarde.
Às cinco em ponto da tarde
As feridas queimavam como sóis.'"

Esta última parte, grifada, é de Garcia Lorca. Só assim, depois de morto é que realmente ele poderia conceder uma parceria com este Husek/Solrac. Trata-se ( a dele, evidentemente) uma das poesias mais lindas da Espanha (Pranto  por Ignácio Sanchez Mejias), um toureiro que morreu sobre as patas e os chifres do touro às cinco horas da tarde.
Por hoje é só. Carlos Roberto Husek

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Latipac-A cidade e seus espelhos e uma mensagem

Prossigo na comunicação anterior sobre o livro Latipac, editado pela Giz Editorial, esclarecendo que após as divisões já escritas (dentro da parte "Do Cenário"), vem a "Das Urbes", cujas poesias se sucedem revelando o espírito de várias capitais e algumas cidades , Rio de Janeiro do mundo e do Brasil, com destaque nos seus poetas e escritores mais representativos. Em cada cidade apontada há um verso, uma quadra, algo sobre algum  poeta que lá viveu ou que ainda vive.
As cidades destacadas são: Atenas, Lisboa, Roma/Florença, paris, Madri, Frankfurt/Berlim,Londres, Tóquio, Pequim/Xangai, Varsóvia/Moscou, Damasco, Calcutá/Mumbai/Nova Délhi, Praga, Santiago/Isla Negra, Nova Iorque, Havana, Buenos Aires, Salvador, Recife, B.Horizonte/Itabira/Ouro Preto, Belmonte, Belém, Goiânia, Macedió, Cuiabá/Corumbá. São Luiz, Cruz do Espírito Santo, Porto Alegre, Curitiba, Teresina e São Paulo.

Atenas:

"Homero visionário,
embora cego,
                planetário,
perseguido
em seus sonhos,
por Sílfides e por cânticos,
viu Ulisses pelos mares
levado pelos acalantos."

Lisboa:

"Cansa-se o magro poeta,
com seu andar de nefelibata,
quando um vento do Tejo,
o frio de sua  alma retrata."

Roma/Florença:

"de uma secada cascata,
e como em magia,
salta dos cabelos da medusa,
o que foi antes água,
e hoje é nostalgia.
Dante repentino aparece,
e se alteia e se enaltece,
   longe de sua musa
   Beatriz, Beatriz,
que pegou de sua na mão,
                  prestativa,
e o conduziu pela via Ápia,
        ainda muito viva,"

Paris:

"Mas a Paris de agora,
que se orgulha de sua torre,
mas a Paris de agora,
que se orgulha de seu Sena,
mas a Paris de agora,
que se notabiliza
por suas avenidas simétricas,
mas a Paris de agora
que se estrela do Arco do Triunfo,
mas a Paris de agora,
que tem suas igrejas e seus túmulos,
mas a Paris de agora,
de sua Champs-Elysées,
mas a Paris de agora,
do bom vinho e do bom queijo,
mas a Paris de agora,
                          da liberdade,
mas a Paris de agora,
                          da fraternidade,
mas a Paris de agora,
                           da igualdade,
mas a Paris de agora,
                    de seus intelectuais,
                    de seus artistas,
esconde seus eventuais
               abjetos exemplares,
como todas as cidades,
               repleta de seus altares,
de seus deuses crepusculares,
              de suas livrarias,
              de seus teatros,
              de seus lupanares."  

Aí vai um pouco da minha poesia.

Lembro, ainda, neste espaço, outras plagas, outras letras, outra geografia interior, por certo mais rica, a de Salvatore Quasimodo, de sua poesia Garça Morta:

"Io mi devoro in luce e suono;             "Eu me consumo em luz e som;
battuto in echi esquallidi                       latejando em esquálidos ecos
da tempo a tempo geme um soffio        de vez em quando geme um esquecido
dimenticato"                                          respiro."

Meu leitor solitário e amigo (no mínimo escrevo para um outro eu, o próprio Solrac), até breve.

CARLOS ROBERTO HUSEK

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos

Este é o último livro que lancei, neste ano de 2012. Trata-se de uma única poesia com 235 páginas, dividida em três grandes partes: Do Cenário, Das Urbes e De Solrac.
Toda temática gira em torno do ser humano e da cidade e como esta é ao mesmo tempo a sua salvação e o seu algoz. Há uma luta constante, um diálogo constante entre as coisas (matéria) e o espírito de cada um: prédios, avenidas, construções

"Viu-se unido às tempestades
e aparelhado
de instrumentos e de ciência
pôs mãos à obra
e construiu a civilização"

e a necessidade do ser humano de entender tudo o que constrói e ao mesmo tempo destrói, em si, na sua vida, no lugar em que vive. O conflito é a regra, é a marca da vida.

"As relações tornaram-se tensas
e intensas.
Esferas de mercados imaginários
foram se entrelaçando,
o mercado financeiro,
o mercado profissional,
o mercado religioso,
o mercado familiar.
Para tais mercados nasceram
os tipos,
os preferidos, os exaltados,
os negativos, que ficavam à margem
da disputa, no limbo das preferências
à procura de caminhos."

Nem sempre esse conflito é anunciado e expresso. Quase sempre é subliminar: doença e morte,

(doenças do cérebro)

"Com isso tudo,
o pior não é físico,
mas o cérebro desconectado.
A palavra não vem à tona,
enrosca-se nos neurônios
quase incomunicável
e desliza pela massa encefálica,
caindo e recaindo
nas entranhas,
nos abismos,
ciscando de encontro
a imagens desencaixadas
que envolvem os vocábulos
e os fazem despencar
até a ponta da língua."

(doenças de outros órgãos)

"O coração falha,
o figado reclama,
os pulmões perdem a elasticidade,
e um leve tremor
de gosto arsênico,
instala-se na garganta
à espera da explosão final."

amor e vida,

"As fases humanas
são as da humanidade
em certa medida.
Da infância à maturidade
vemos as emoções aflorarem
e depois serem recolhidas."

"Vem o homem cata-vento,
girando para todos os lados,
tirando da cartola ninhos
de afetos despedaçados."

"Vem a mulher desatenta,
de passos comedidos,
tirando da cartola ninhos
de afetos perdidos."

poder e desamandos,

"O poder inebria e enlouquece,
aquece o peito
e tudo aquece.
Vivas ao rei desnudo!
Vivas à mesa dos acólitos!
Vivas aos paetês e veludos!
Vivas, que de vivas se vive,
sem viver tudo."

a natureza está no entanto sempre presente, independentemente das criações dos homens e o retorno a ela se faz com a própria luta do ser humano para sobreviver.

Aí está um começo de minha poesia, pinçados alguns versos dentro dos Capítulos estruturados. Se me permitirem (os olhos e o cérebro do leitor e o tempo disponível) volto ao tema na próxima comunicação. Peço paciência para este que se comunica pelo blog porque a comunicação presencial, no mundo da informática, não é mais real (é, talvez, a verdadeira comunicação virtual). Carlos Roberto Husek

Início

Hoje, 2.10.2012, inauguro meu blog de poesia e literatura.
Venho comunicar-me. Por vezes falerei (escreverei) como Solrac; outras, como Carlos.
Pretendo desenvolver não só as minhas próprias palavras, mas, principalmente, a de escritores conhecidos e mestres (quantos mestres..!). Não entendo bem o que seja um blog. Uma forma de comunicação, sem dúvida.
No caso do "Poesiasolrac", é um pouco mais díficil, porquanto o lado espiritual e anímico fala mais alto e impõe a sua regra. Todavia, não se trata de monólogo, porém de um verdadeiro diálogo. Palavras que exigem palavras em resposta, ainda que a resposta não chegue a mim (de alguma forma ela virá, pelo espaço, pelo éter) e nós estaremos em grande e inusitada comunicação. Inusitada? Não tanto, porque, na verdade, toda e qualquer comunicação se faz, no fundo, por meios não materiais. As palavras e os gestos, tão necessários, materializam em parte o que somos. O que somos? É o que pretendo descobrir. Somos um, somos todos, somos nehum.
Aproveito para divulgar, na medida do possível, e sem pensar em atormentar ninguém e sem preocupação com regras gramaticais (maravilha da tecnologia!) alguns textos meus, que sei serem de difícil leitura (eles precisam de glosa, de explicação, de interpretação...não sei se conseguirei?! Vale tentar.). Se não conseguir, encerrarei este blog em um caixão virtual e ele desaparecerá, assim como nasceu, do nada (trata-se de uma promessa). Até mais. Carlos Roberto Husek