quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos

Continuamos um périplo pela poesia Latipa, destacando os capítulos de que ela composta, agora "Das Urbes", em que observo versos sobre a grande maioria das capitais do mundo e do Brasil, com apontamento de suas características (poéticas, não geográficas, políticas ou econômicas) e de seus representantes intelectuais (principalmente poetas). A idéia em relação a estes é a de que os poetas tem antenas com as quais conseguem sentir o que está no ar, no presente, o que vem do passado, (no mundo nada se perde, tudo se transforma), e que  se apresenta para o futuro ( na verdade, passado, presente e futuro fazem parte de uma mesma realidade: tudo é o agora, o tempo é uma ilusão).

Frankfurt/Berlim

(destacando Goethe)

"Fausto olha-se no espelho
e o medo arrepia-lhe a espinha,
uma caveira ancestral
sorri absorta,
enquanto pela ação do vento
uma janela se abre,
estremecem os trincos
de uma porta de fundo,
bate-se outro na porta,
que anuncia o lamento
                           do mundo"

(destacando Heine)

'"Seiscentas peças barganhei
    ...Que pechincha!
               ....no Senegal;
A carne é rija,
Os músculos de aço,
boa liga do melhor metal"'
Os escravos que em navios
              partiram
pela venda por seus algozes,
só cantavam suas tristezas,
só se ouviam suas vozes,
lá, como no Mundo Novo,
   a sensibilidade aflorou,
   e o poeta reagindo,
contra este capital
               se arvorou,
o comerciante só via as moedas,
escorregadas sobre os peitos magros,
e que tilintavam na dança,
    do oceano aziago.
'"Crito Jesus, lá de seu horto,
Salva meus pretos, eu te peço!
Se não chegar metade ao porto,
Deste negócio eu me despeço.'"

O que vem grifado (como já expliquei) pertence à minha poesia, mas é transcrição que nela faço de versos do próprio poeta destacado.

Importante dizer que a escravidão continua na pele preta, na pele branca, na pele amarela, e em outras peles e roupagens, nem sempre físicamente imposta.
As cidades, fontes de relacionamentos e oportunidades, são ao mesmo tempo fontes de tristezas e incompreensões. Naquele tempo de Johann Wolfgang Goethe ( idos de 1750/1800) e de Heinrich Heine (idos de 1827/1840), a miséria humana, as crenças, a tentativa de respaldo e segurança com o mundo espiritual, uma vez que o mundo terreno parece pobre e inseguro. O dinheiro, como deus, a regrar as relações humanas, a fazer vistas grossas para a dignidade, a ignorá-la, a ver o ser humano como mercadoria, antes consagrando na diferença de raças, hoje consagrando na diferença de conceitos. Penso que o abismo continua entre os seres humanos, independente de raça ( e até somando-se a ela), abismo não de cultura: abismo da falta de solidariedade, abismo da falta de amor, abismo da falta de condescendência, abismo da falta de amizade; abismo da existência mesma, que nos faz pensar sermos únicos em nossa personalidade, em nosso caráter, em nossa filosofia, em nossa particular justiça. Aí só nos resta apelar para o mundo invisível ( os espíritos que nos ajudem: anjos ou demônios) e para o poder do mundo visível (poder de mando, poder do dinheiro, poder da posição social). O mundo progrediu tecnologicamente, mas continuamos, individual e socialmente, os mesmos. Os poetas não são passados, são presentes e futuros. Goethe e Heine poderiam estar vivos, fisicamente, que fariam, sem dúvida, poesias extraordinárias. O mundo não mudou muito. Carlos Roberto Husek. 

Um comentário:

  1. Dizem que concordo vem do latim "com coração". Concordo muito com seu texto.

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