sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


A vida é sempre recomeço,
mas não começa do nada,
há sempre algo que sobra,
para uma nova murada,
somos células, átomos,
que advém de outros,
           reproduzidos,
nada é novo sob o sol,
nada é novo na vida,
o sol que se põe nasce,
o que nasce há de morrer,
mas morre uma tarde
para logo renascer.
Há coisas eternas,
   e indestrutíveis,
sobre a camada de vida,
a própria morte impera,
impera a própria vida,
há sempre um recomeço,
no começo de tudo,
à noite anoiteço,
de madrugada fico mudo,
de manhã amanheço,
vivo, respiro, aconteço,
mas de noite anoiteço,
de madrugada fico mudo..
A vida é tudo...
      A vida é tudo...
           A vida é tudo....

Carlos Roberto Husek
 

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Solrac

(Aqui o destaque é o próprio Solrac)


Ao andar pela cidade,
uma tristeza o invade,
uma dúvida o atormenta,
uma imagem desfocada,
  a cada esquina dobrada,
a cada avenida percorrida,
revela o irrevelado,
na imagem compadecida.
Solrac antropofóbico,
      misantropo,
      retraído,
vê fugirem pelas ruas,
seus passos de menino,
e já cansado e doído,
      esfriando,
      amortecido,

Ao final da tarde, de toda tarde, o sol se põe pintando de laranja o céu.... Só resta a lembrança das coisas marcadas por este evento, que pode ser um mantra poético, mais ou menos assim:

Fim de tarde,
   fim de tarde,
fim de tarde,
   fim de tarde.

É um tempo de morte e de vida,
entre a noite e o dia,
entre o dia e a noite,
uma suavidade,
              um açoite.

A vida é assim,
um caminhar contínuo
deixando pelo caminho,
flores, galhos, arminhos.

Fim de tarde,
   fim de tarde,
fim de tarde,
   fim de tarde

A lua chegou pálida
e o sol já não arde.

Só resta a esperança
       que a vida,
se renove compadecida,
entre as coisas renovadas
     e as perdidas.
            
Fim de tarde,
   fim de tarde,
fim de tarde,
   fim de tarde.

A lua chegou pálida
e o sol já não arde.
na sequência do caminho
.......................................
         entre
flores, galhos e arminhos.


Não sei se quem acabou de escrever estes versos foi Solrac ou o Carlos. É apenas um mantra que serve para as festas e para os velórios.  Carlos Roberto Husek

domingo, 23 de dezembro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Ao término da análise das cidades, destacamos do nosso livro boa parte das capitais e de algumas cidades do mundo e do Brasil, com seus poetas, vamos a uma parte mais específica da minha poesia "Solrac". Antes disso, informamosque cada capítulo de capital terminou com o seguinte refrão:

As cidades não se fazem
apenas na arquitetura,
             pessoas
são seu sangue, sua energia,
sua féruia e brandura,
há nomes que personalizam
cada avenida, cada rua.

O livro - peço desculpas aos eventuais leitores - resolvi divulgar, de início, o livro latipac, apenas para explicitá-lo àqueles que o compraram e não conseguiram ler, ou que não puderam comprá-lo. Ele, na verdade, é dividido em três grandes partes: "Do Cenário", onde busco desenvolver a criação das cidades, física, psicológica e socialmente (da pág. 15 à 77); "Das Urbes" onde procuro especificar cada cidade do mundo e do Brasil, vai de Atenas a São paulo (da pág. 79 a 187); e, "De Solrac" uma visão particular desse alter ego sobre as cidades, sobre a existência humana (da pág. 193 a 235).
Esta última parte é precedida pelo seguinte refrão, que vem no início de cada capítulo:

Solrac não tem desejos,
Solrac não tem perdão,
Solrac não tem lampejos,
Solrac não tem razão,
Solrac é só momento,
de entrega e compaixão.

Carlos Roberto Husek.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


São Paulo

(destacando Guilerme de Almeida, versos grafados de "Simplicidade,Felicidade")

Em cada verso,
em cada humana voz,
há uma simples morada,
que se esconde sob as jóias,
que se esconde sob os cargos,
que se esconde sob as comentadas,
a morada da simples humanidade,
"Ser como as rosas, o céu sem fim,
a árvore, o rio...Por que não há de
ser toda gente também assim?"
.........................................................
"Chamou-me e disse:
              'Vou-me embora!
Sou a felicidade! Vive agora
da lembrança do muito que te fiz!
... só quando ela partiu,
                 contou quem era...
E nunca mais eu me senti feliz"
........................................................

(destacando Menotti Del Picchia, versos grafados de "Máscaras")

na cidade que se desfolha
a cada minuto, a cada hora,
sempre existem dois lados,
um lascivo, outro sonhador,
outro o da morte,
           outro o do amor,
mas que não vivem separados,
porque ambos se encontram
                                  unidos,
embora nunca sejam
             desse modo percebidos.
"Esse amor deu-me o desejo
daquele beijo encontrar.
Mas nunca, reunidas vejo
a volúpia desse beijo,
e a tristeza desse olhar."

Guilherme de Almeida, príncipe dos poetas, nasceu em julho de 1890, em Campinas, e morreu em São Paulo, em 11 de julho de 1969. Menotti Del Picchia, nasceu em São Paulo, em março de 1892 e morreu em São Paulo, em 1988.
Dois grandes poetas que conduzem a arte pela simplicidade. A inteligência e a arte encontram um caminho mágico na comunicação simples e ao mesmo tempo forte e profunda. Poucos conseguem essa façanha.  Guilherme de Almeida e Menotti Del Picchia puseram fogo na minha imaginação, mal havia conhecido o mundo. Pequeno, criança, início de adolescência, não sei bem, é fato que passava os dias com alguns poucos versos, de ambos e de outros poetas e preenchia o espaço da comunicação (quase sempre incomunicável) com estes e outros versos. O eterno problema - todos nós o temos - de não entender e não se fazer entender, entre olhares, falas e gestos. A comunicação da vida e a interpretação dos fatos tem olhares específicos, de cada um, que ao serem expostos quase nunca são compreendidos. Afinal, o que é a felicidade, o que é o amor, o que é a morte? (temas básicos) Se alguém acha que sabe a resposta, provavelmente se ilude.Carlos Roberto Husek

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Rio de Janeiro

(destacando Vinicius de Moraes, versos grafados de "Soneto da Hora final")


"Ao transpor as fronteiras
                      do Segredo
Eu, calmo, te direi:
                - Não gtenhas medo
E tu, tranquila, me dirás:
                - Sê forte.
E como dois namorados
Noturnamente tristes e enlaçados
Nós entraremos
          nos jardins da morte."
..................................................

De repente, do pranto o riso,
e do riso o pranto longo,
de repente, o despertar sem som,
e o dormir sem estrondo,
de repente, uma dura realidade,
nos mineralizará eternamente,
de repente, tu serás aquela
    que olharas antigamente,
nos velórios familiares,
e eu serei aquele que pensava
                    nas distâncias,
dos entes que se foram
    sem aviso e sem licença,
de repente, seremos dois
    com esta mesma essência,
fazendo iguais papéis
para os que ficaram presentes,
de repente, seremos dois
    simplesmente ausentes,
de repente, os teus iguais,
não necessitarão ser mais chorados,
de repente, todos estaremos
                               clarificados,
e a morte não terá sucesso,
        o sucesso esperado,
porque tudo estará em sombra,
    irremediavelmente acabado.

De repente,
 não mais que de repente,
esta poesia nasceu assim,
descontente,
esta poesia nasceu assim,
ausente,
 esta poesia nasceu assim,
 virtualmente posta,
esta poesia nasceu assim,
disposta,
esta poesia nasceu assim,
composta,
em resposta a nada,
de repente, é manhã,
ou madrugada.
A vida é um repente
           a vida é um nada.

Carlos Roberto Husek

que o dia tem,
de repente

domingo, 9 de dezembro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Teresina

(destacando Torquato Neto, versos grafados de "Cogito")

Caminhando pelo Nordeste
sobre o escaldante chão
    de raios,
sobre a sobra
           dos ventos lacaios
que ao cair da tarde.
.......................................

"Eu sou como sou
              Vidente
E vivo tranquilamente
Todas as horas do fim."


Torquato Pereira  de Araújo Neto, nasceu em Teresina, Piauí, em 1944 e morreu no Rio de Janeiro, em 1972. Uma das vozes do tropicalismo afirmou: "Escolho a Tropicália não porque é liberal, mas porque é libertina." Carlos Roberto Husek.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Curitiba


(destacando Paulo Leminski, versos grafados de "Aviso aos Náufragos")

Sobre a terra vermelha,
passou o homem,
          o asfalto cinza,
e sobre o asfalto,
fez surgir toda espécie
             de veículos
que passaram a transitar
carregando tijolos e ferros,
quadricularam-se as ruas,
e toda gente passou
        a se cumprimentar,
dentro de seus grupos
        e de suas simpatias,
nada podia viver
de concreto na poesia,
nada podia viver
de romântico na poesia,
nada podia viver
de parnasiano na poesia,
nada podia viver
de simbólico na poesia,
nada podia viver
de surrealista na poesia.
nem de moderno,
nem de expressionista,
numa cidade de ferro,
numa cidade de prédios,
numa cidade lapidada,
numa cidade acabada,
somente um poeta,
......................................
"Nasceu para ser pálida,
um mero plágio da Ilíada,
alguma coisa que cala,
folha que volta para o galho,
muito depois de caída."

Nasceu em 1944, em Curitiba e morreu em 1989, na mesma cidade, decorrente de um alcoolismo crônico. Veio do concretismo e deixou-se influenciar pela poesia japonesa (haicais), pela música popular e pela poesia beat: "Eis a voz, eis o deus, eis a fala,/ eis que a luz se ascendeu na casa/ e não cabe mais na sala."
Outros versos característicos:"aqui jaz um grande poeta,
                                                 nada deixou escrito,
                                                 este silêncio, acredito,
                                                 são suas obras completas."
Poesia é isto. Em poucas palavras fala-se tudo.Carlos Roberto Husek

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Porto Alegre

(destacando Mário Quintana, versos grifados de "A rua dos Cataventos" e de "Recordo Ainda" )


"Da vez primeira
em que me assassinaram,
Perdi um jeito de sorrir
                 que eu tinha.
Depois, a cada vez que
                 me mataram,
foram levando
qualquer coisa minha."
.....................................
Todos envelhecem
        sobre as rédeas,
     sobre os volantes
dos cavalos modernos,
pendurados nos veículos,
aboletados nos coletivos,
escondidos os meninos,
que estão sob as gravatas,
que estão sob as responsabilidades
           distribuídas nas cidades.
"Sou um pobre menino...
              acreditais!...
Que envelheceu um dia,
              de repente!..."

Mário Quintana nasceu em Alegrete, Rio Grande do Sul em 30 de julho de 1906, e faleceu em Porto Alegre, em 5 de maio de 1994:

"Este quarto de enfermo, tão deserto
de tudo, pois nem livros eu já leio
e a própria vida  eu a deixei no meio
como um romance que ficasse aberto...

que importa este quarto, em que desperto
como se despertasse em quarto alheio?
Eu olho o céu! Imensamente perto,
o céu que me descansa como um seio.

Pois só o céu é que está perto, sim,
tão perto e tão amigo que parece
um grande olhar azul pousado em mim.

A morte deveria ser assim:
um céu que pouco a pouco anoitecesse
e a gente nem soubesse que era o fim."

(poesia "Este quarto")
Mário Quintana é o protótipo do solitário "Morrer é esquecer as palavras" (A noite grande). Apesar da solidão, sua poesia tem humor, lirismo, malícia, ingenuidade, ironia, simplicidade. Carlos Roberto Husek

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Latipac - A cidade e seus espelhos


Cruz do Espírito Santo

(destacando Augusto dos Anjos, versos grafados de "O lamento das coisas")


"...O verme - este operário 
              das ruínas -
Na frialdade inorgânica
              da terra"
É que aprimora sua oficina
na guerra, destruição,
a comer os epitélios
na louca escavação.
Tudo produz ruído, sons,
     surdos ou estridentes,
que as cidades multiplicam
e que perduram como um 
                 ranger de dentes,
o peota de negro vestido,
sente como  uma caixa
                 de ressonância,
desde a amargurada infância, 
todas as dissonâncias do gemido.
" Triste, a escutar, pancada
                           por pancada,
a sucessividade dos segundos"

Augussto dos Anjos, poeta singular, salvo engano,  não teve seguidores e não seguiu nehuma escola específica. Nasceu na Paraíba em 1884 e faleceu em 1914. Fez versos originais, repleto de imagens fortes e cruas sobre doença e morte, mais em seus aspectos físicos:

"Já o verme - este operário das ruínas -
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida, em geral, declara guerra,
Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!"

As imagens, embora fortes, são belas, em termos de poesia. A poesia não tem um teor definido, uma matéria que lhe é própria. Pode-se fazer versos sobre a natureza, sobre as pessoas, sobre a vida, sobre a morte, sobre as catástrofes, sobre a filosofia (é possível filosofar por intermédio da poesia), sobre a história, sobre o amor, sobre a própria poesia, sobre o dia a dia, sobre o infinito, sobre pequenos insetos, sobre os grandes animais, sobre os velhos, sobre os jovens, sobre a tecnologia, sobre o sexo, sobre as raças, sobre os partidos políticos, sobre os esportes, sobre as angústias, sobre a felicidade, sobre Deus, sobre o diabo. Enfim, o olhar poético é, de início, um olhar interior sobre tudo que existe, que é visualizado, sentido, pensado, intuido. Carlos Roberto Husek

sábado, 1 de dezembro de 2012

Exercício para o poético


Aqui nos permitimos sair um pouco da nossa poesia (Latipac), para flanarmos no fazer poético. Escrever, escrever. Há uma sensação de incompletude na escrita. A escrita nunca se completa e nunca se mostra inteira e não traduz nunca o momento do espírito. Se isto é uma verdade, e cremos que é, porque a apreensão da realidade é um momento complexo e passa por um filtro, o filtro do corpo físico (olhos, ouvidos, sentidos, em geral), transformando a realidade no momento mesmo da referida apreensão, a poesia é o veículo mais apropriado para tanto, porque mais sutil. Os instrumentos da poesia são mais evocativos da sensibilidade, e portanto, mais propensos a repercutir a realidade na sua dimensão íntima e efetivamente real. O que vemos é parte da realidade. A tradução que automática ou estudadamente fazemos do que vemos é a realidade que sentimos, que nos vem ao espírito. A realidade é pois, sempre, a junção do que vemos, ouvimos, sentimos, com a interpretação que fazemos dessa apreensão. Por isso, quando faço poesia, interpreto o mundo (que nos parece real, fotográfico), íntimo, interno (tristeza) ou externo (árvore) e crio para a vida outro objeto que deve ser apreendido e traduzido (interpretado) por outra pessoa, construindo esta, a sua própria realidade.

Branco, branco, o peixe prateado,
à luz do sol branco e argênteo,
sobre as águas cristalinas e azuis.
A predominância do branco
no meu espírito enlutado,
é a luz que vejo na percepção
                              do mundo,
de um fato aparentemente simples,
como um peixe nadando 
nas águas claras de um rio,
iluminado pelo dia,
em contraste com a solidão,
por si escura e intraduzível,
de um véu que perpassa
e filtra pelos meus olhos,
o peixe, a água, o sol, o rio.

Eis o que digo, numa poesia (poesia?) que agora criei, diante de uma visão material e de uma sensação do espírito. Estranho? A poesia (como qualquer arte, ou que pretenda ser uma arte) não é veículo para a normalidade, simplesmente fotográfica dos fatos, das coisas, dos sentimentos. A poesia é, por si,  estranha. Daí porque muitos não a entendem. Para entender de poesia é necessário deixar uma janela aberta para o infinito. Intuir, sentir, invocar, provocar, influir, refluir, liberar os sentidos, abrir os canais. É sempre metalinguagem, é sempre metafísica, é sempre sutileza, mesmo que fale de coisas concretas. Carlos Roberto Husek

Latipac - a cidade e seus espelhos


São Luis do Maranhão

(destacando Ferreira Gullar, versos grafados de "João boa morte - cabra marcado para morrer")

Sua poesia é força e çuta
            grito alto,
            denúncia,
            engajamento,
            sedução,
um pouco de sofrimento,
da gente do sertão,
da história do João,
do João Boa Morte,
que lutou para sobreviver,
lutou contra a sorte.
.......................................

"que ele derrota o patrão
que o caminho da vitória
está na revolução."

José Ribamar Ferreira, nasceu em São Luís em 10 de setembro de 1930, talvez o maior nome da poesia no Brasil, nos dias atuais. Poesia engajada e ao mesmo tempo romântica: "Minha amada tem palmeiras/onde cantam passarinhos/e as aves que ali gorjeiam/ em seus seios fazem ninhos." Carlos Roberto Husek