terça-feira, 16 de abril de 2013

Palavras jogadas e indisciplinadas


Na página 1543, do vol.III,  da História da Literatura Ocidental, de Otto Maria Capeaux, deixei uma folha de papel com uns versos, escritos a tinta azul, sem título. Quando os escrevi? Não sei, mas podem ser muito antigos. Aí estão:

No vazio
as palavras perdem
          o conteúdo
e se dissipam
          em letras.
No vazio
só o silêncio fala
no vazio da sala.
No vazio da noite
há rumores, enganos,
vocábulos ciganos,
que não criam
                   raízes,
e se dispersam
      em cicatrizes,
e deles nascem
verbos dissonantes,
em trabalhoso parto.
No vazio da noite,
no vazio do quarto.

Por curiosidade olhei o que estava escrito na página apontada do referido livro, e nela estava escrito que: "Três poetas ingleses dominaram a literatura européia da primeira metade do século XIX: Shakespeare, Scott e Byron. A influência da Shakespeare foi mais permanente e a de Scott mais extensa, sem exagero, que nunca um poeta impressionou tanto os seus contemporâneos como Lord excêntrico. Byron apareceu como um meteoro; e desapareceu como um meteoro. Em certo dia do ano de 1812, Byron, até então um poetastro de versos classicistas, maltratado pela crítica, 'acordou e encontrou-se famoso':"
O que tem a haver o referido texto com o poema guardado? Nada, absolutamente nada, a não ser pelo fato que se trata de um capítulo sobre o Romantismo e os versos acima tem um quê no velho estilo romântico. O último poeta citado por Carpeux, Byron, foi um incorrigível romântico, um romântico louco, um louco de temperamento incontrolável, disposto para a briga (seja ela qual for, seja qual for o motivo), selvagem, "uma alma demasiado delicada e cheia de amargura, num corpo por demais ávido de prazer - eis aí o trágico paradoxo da personalidade de Byron" (Vidas de Grandes Poetas, de Henry Thomas e Dana Lee Thomas, Editora Globo). Não há no mundo moderno possibilidade de rompantes histéricos, românticos, desvairados, no sentido do desforço psicológico ou físico, mas Byron, no fim, era um crente da palavra (todos somos - aí está a verdadeira loucura...), e escreveu: "Porque as palavras são coisas; e uma pequena gota de tinta/ Ao cair, como orvalho, sobre uma idéia, produz/ Aquilo que faz com que milhares de pessoas, talvez milhões pensem.". Nós que acreditamos nisso, temos uma espécie de romantismo embutido, crente na transformação pela palavra; semente que cai no espírito e faz nascer um jardim.
No vazio da noite
no vazio do quarto.
Verbos dissonantes
em trabalhoso parto. 
Muitas poderiam ser as variáveis:
No vazio dissonante
      do quarto,
No parto da noite,
verbos desatam
como açoites,
e desatam nós
de vocábulos,
que saem correndo,
em disparada,
como cavalos
selvagens e bravos.
As palavras não são disciplinadas porque informadas pelo espírito que é livre, mas podem ser equívocas e contornarem os fatos. Freud explica. Carlos Roberto Husek.
                                                       

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