terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

O fio que liga os poetas


Os poetas formam uma família, ou no mínimo uma irmandade. Em Paris, em Roma, em Lisboa, no Brasil, no Japão, na Coréia, não importa a situação geográfica do nascimento, porque os une uma mesma forma de ver a vida. Vê-la pela janela da alma, nas sua sutilezas, como um fio (fio de prata?), fio vibrátil que perpassa por todos que conseguem por nos olhos algumas lágrimas por nada, por coisa nehuma, por fatos pequenos, por fato nenhum, sem a mínima importância social, ou até pelas grandes comoções da vida. O que os diferencia de outros seres humanos é a possibilidade de fazer brotar a emoção ao mesmo tempo que o raciocino, diante de um tempo e de uma necessidade. O poeta tem duplicidade; dobra-se, desdobra-se, transforma-se em miríades de átomos e se espalha nas coisas mais ínfimas, sem que o percebam, e depois, se refaz inteiro para as relações do dia. "O poeta é um fingidor/finge tão completamente/que chega a fingir que é dor/a dor que deveras sente" (Fernando Pessoa).  Vejam as imagens destes poetas coreanos:

poesia de Bak Hi-sóg:

"                              A vela
                               trêmula 
                         faz companhia
                       a meu sono leve

                    Fragmentos de sonho
                       ardem de saudade
                          da amada
                          ausente

  A lua já se pôs e os cucos já cessaram seu canto
                Agora somente o jardim
                pleno de pétalas caídas."

A vela trêmula arde e derrete, como o sono leve que arde e treme no sonho da amada. A própria lua desaparece e cessam os cucos (tudo desmaia, tudo morre), até o próprio jardim está repleto de pétalas caídas. Enfim, tudo arde, treme, desmaia, cai, desaparece diante da saudade imensa da amada ausente (também sonhada e desparecida). Não há beleza no universo, não há vida no universo. O cenário é de deserto para o poeta que se  vê sozinho (sozinhando, como diz Mia Couto). Parece que em alguns momentos da vida, poderemos estar sozinhando, mas mesmo assim continuamos vivos.

poesia de Shin Hi-mun:

             "A mesma dor
             de quem fica
           está no coração
           de quem parte

             No ardente
         inesquecimento
       as duas entranhas
       vão apodrecendo

    Amada pensa mais um pouco:
           Deves realmente
                   partir?"

Não necessita de explicação. Simples e ao mesmo tempo profunda.

poesia de Kim Gu:

"       De tanto
          querer
     que aqui seja ali
        e ali aqui

          Aqui
          e ali
     tornaram-se 
       distantes

Desejo ser uma borboleta
     em permanente
       vai-e-vem."

Influenciado faço alguns versos (ou algo parecido), com os temas, unindo-os. Podemos unir tudo (afinal a separação que fazemos do mundo e das coisas é mera ilusão):

A vela
    vela o sono,
trêmulo
e fragmentado.
O sonho aqui,
ali se espandindo,
  as pétalas
          caíndo.
     Eu.....
   derretido
         e apagado
   vou aos poucos
       sumindo...
       sumindo.

Carlos Roberto Husek.


Um comentário: