sábado, 23 de março de 2013

Pensando em voz alta (ou escrita)



Rolands Barthes diz que a poesia é sempre diferente da prosa, mas tal diferença não é de essência, é de quantidade. A língua é a mesma. A poesia clássica era sentida apenas como uma variação ornamental da prosa, fruto de uma arte, de uma técnica. Hoje, a poesia não é mais uma prosa decorada de ornamentos e amputada de liberdades, e sim um atributo, uma substância. Entendemos que é possível a prosa poética e, por óbvio, a poesia pura (tudo é poesia); um transcorrer de idéias, sentimentos, sensações, que busca um outro olhar sobre a vida; um olhar que vem de dentro para fora, recheado de coisas inexplicáveis pela linguagem comum (descritiva, científica, romanceada e etc). É um sentimento do mundo (Drummond), cuja a concretização pelas palavras necessita de técnica específica, porque elas (as palavras) não são suficientes para expressar o momemnto. Como expressar uma profunda tristeza, ou um profundo amor, ou uma profunda entrega, ou uma profunda injustiça? Por mais que se escreva, o que está por trás dos vocábulos, das linhas, dos verbos, dos adjetivos, dos substantivos é muito mais do que aquilo que aparece escrito. No próprio pensamento sobre as palavras, a poesia e o poeta põe o pensador em um tabuleiro comunicativo sem aparencia lógica. Antes de inventarem o computador, as dimensões da realidade através dos aparelhos (agora, a impressora que faz o objeto - um revólver, uma orelha, um liquidificador, um doce..! -), o poeta já pensava em dimensões não usuais e por vezes se comunicava de forma ilógica, porque vivia essa realidade que lhe é própria, composta de várias facetas, impossíveis de serem vistas ou sentidas pelo homem comum das ruas, ou pelos comunicadores comuns da prosa. Manoel de Barros, poeta, de todos nós conhecidos, ao falar sobre estas "realidades", em um poema, do livro "O Guardador de Águas" ´(só o nome da obra já é uma incompreensão para as mentes estritamente lógicas que enxergam a vida de forma unitária ou binária, mas bem definida), verseja:

"Não tenho bens de acontecimentos.
O que não sei fazer desconto nas palavras.
Entesouro frases. Por exemplo:
- Imagens são palavras que nos faltaram.
- Poesia é a ocupação da palavra pela Imagem.
- Poesia é a ocupação da Imagem pelo Ser.
Ai frases de pensar!
Me acho em petição de lata (frase encontrada no lixo).
Concluindo: há pessoas que se compõem de atos, de ruídos, retratos.
Outras de palavras.
Poetas e tontos se compõem de palavras."

 Embora eu tenha - creio que nós todos temos, mesmo Manoel de Barros - "bens de acontecimentos", também me acompanho, me apresento, me sinto, me personifico em palavras. Mas acho que estou mais para tonto do que para poeta. Afinal, o tonto, o louco, o poeta, são irmãos e dizem coisas que às vezes tocam o coração e as mentes, às vezes podem não passar de bobagens comunicativas (enquanto comunicação) mas que são verdades profundas para eles. Digo (em "versos"), imitando Manoel de Barros:
 
                      Minhas frases estão acostumadas
                      à minha comunicação interior.
                      Não tenho culpa se por vezes escapam
                      e doem na mente do amigo leitor,
                      como um acontecimento sem nexo,
                      meus sentimentos copulam as palavras,
                      na incompreensão deste sexo,
                      que faço em noites vazias,
                      nu das minhas filosofias,
                      num apertado encontro. Amplexo.
                      Minhas frases não rendem homenagem
                      às regras gramaticais,
                      visto apenas tal roupagem,
                      que é própria de nós: animais.

                       Meus sentimentos vazios,
                       sobrevivem sempre mais.

Aí estão meus versos para a incompreensão de todos. Fazer-se compreender, é muitas vezes, viver a mesmice, que é necessária para a vida social, mas nem sempre está na cogitação de quem escreve. Poesia é música e a musicalidade está além das notas que a concretizam. Carlos Roberto Husek. 
                                            

3 comentários:

  1. O poeta ou o louco quem sabe.... Falam a linguagem da alma, eis a questão.... A linguagem da alma não se explica ela apenas se manifesta e pronto.

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  2. E o coito não se encerra no poeta
    Vez que na mente no leitor
    Ele se transmuta, alça vôo
    Ganha fulgor, se completa

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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