quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Fujo e finjo



Refugio-me na poesia,
      dentro de minha noite,
a qualquer hora do dia.

Fujo...

Talvez fuja,
                        talvez finja,
talvez finja que fuja
               e em fuga fingida
vou fugindo da vida...

Fujo...

Refugio-me na poesia,
      dentro de minha noite,
a qualquer hora do dia.

Fujo...

De mim, é certo.

Dos meus olhos secos,
              e dos meus gestos,
ora largos, 
                       ora contidos, 
que aproximam,
                  que distanciam,
que recebidos
               com generosidade
são generosamente
                      reproduzidos,
que recebidos
                com desconfiança
são tristemente
                           recolhidos.

Fujo...

De mim é certo.

De quem está por perto,
                          ou se longe
se precipita,
               e nesse vai e vem 
de atração e desdém,
                  de afastamento
e de acolhida,
          de certa indiferença
ou de apego comedido,
  em tudo há um empenho
sem sentido,
              em tudo uma lida.

Para que serve a poesia
          se não é para fugir?

Fujo...

De mim é certo.

De tudo, de todos,
              dos lugares frios,
e das distâncias
                    que percorro,
embora cada vez mais
                     me distancie,
e das corridas
                          que corro,
entre sombras e sóis,
       dos morros que subo,
disfarçado entre lençóis,
                    e das encostas
em que me lanço,
      e desses altos e baixos,
gangorras e planícies
              de que, por vezes 
me canso.

Para que serve a poesia,
         se não é para fingir?

Finjo...

Fujo e finjo...

Refugio-me na poesia,
     dentro de minha noite,
a qualquer hora do dia. 

Fujo...

Talvez fuja,
                       talvez finja,
talvez finja que fuja,
             e em fuga fingida
vou fugindo da vida.


Carlos Roberto Husek








Um comentário:

  1. Viver é isso? Fugir, fingir, fingir, fugir, ... Essa é a cadência de quem não quer viver, ou quer?
    Complexo e bonito esse poema! Bem real!

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